segunda-feira, 18 de julho de 2016

B de Biorritmo (CLVIII)


SHE LIVES BY THE CASTLE


Meu amor - assim começavam
quase sempre os poemas
de que menos conseguia gostar.
Mas é verdade (a verdade
e a retórica nunca se entenderam)
que um bando de gaivotas atravessa
o pouco céu que vai da Sé aos Clérigos.

Tu dormes; nunca estivemos aqui.
A cortina por levantar, de um amarelo
duvidoso, a varanda sobre ruínas,
casas onde morou gente,
telhados abatidos que me servem
de cinzeiro. Tu dormes,
rosto abertamente escondido
sob lençóis brancos, almofadas
com brasão, espelhos dos anos vinte.

Não sabes, não sabemos, de melhor castelo.
Ignoras devagar os motivos que
em breve nos farão descer do quarto
209, Grande Hotel de Paris,
atentos aos primeiros sinais do nada.

E assim, meu amor, acaba este poema.


Manuel de Freitas
in Sunny Bar, com sel. de Rui Pires Cabral, posfácio de Silvina Rodrigues Lopes,
capa de Luís Henriques e arranjo gráfico de Pedro Santos, Lisboa: Alambique, 2015

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