sábado, 15 de setembro de 2012


[…] Quando estou naquilo a que os rigoristas chamam bem, aspiro ao mal porque me é necessário um certo mal para me distrair; quando estou no que se convencionou chamar mal, sinto uma nostalgia confusa, como se o que o comum das gentes entende por bem fosse realmente uma espécie de seio maternal donde se poderia sugar um leite susceptível de refrescar. Toda a minha vida é feita destas oscilações: se estou tranquilo, aborreço-me de morte e desejo não importa que alteração, mas, mal surge na minha existência um real elemento de subversão, perco pé, hesito, esquivo-me e a maior parte das vezes renuncio. Sou incapaz, em todo o caso, de agir sem reticência e sem remorso, nunca me entrego sem uma segunda intenção de voltar atrás e, se permaneço dobrado sobre mim mesmo, não é nunca sem a nostalgia de um abandono, que desejo veementemente. […]


Michel Leiris, Idade de Homem,
Lisboa: Editorial Estampa, 1971

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